SÍTIO ARQUEOLÓGICO

Aquarela sobre papel - Jules Martin. Museu Paulista - USP




Deus sabe o quanto acho tedioso e sem atrativo esse novo caminho de terra batida a que chamam de “Paulista”. Mas enfim, a vida na administração dos cafezais pede ares urbanos, e não me resta alternativa a não ser usufruir deste meu casarão no planalto de Piratininga, já que as economias escassas impossibilitam os três meses de veraneio pelo velho mundo a que estava acostumado.



Anuncia-se para amanhã um grande comício com o candidato Campos Salles. Passo ao largo de manifestações públicas, ainda mais correndo o risco de encontrar no meio do populacho o dono da casa bancária da qual sou devedor.


Dona Veridiana Prado convidou-me para um sarau no sábado, e não sei ainda que desculpa sacar do bolso do colete para que não seja forçado a ostentar, entre os abonados paulistanos, meu único e puído fraque. Que vergonha ver o brasão de minha família perder o brilho de outrora, conquistado bravamente à custa da cana e do ouro. Agora fico à mercê dos altos e baixos deste amaldiçoado café, submetido aos caprichos do mercado externo – este monstro oscilante e alheio ao poderio dos meus antepassados.


O cheiro de mofo de casa fechada precede o desfazer das malas. Tomo assento na cadeira da varanda e recebo da mucama um refresco de tamarindo. O ar parado, a avenida muda, só um farfalhar de árvores e o voo de uma ou outra perdiz. Quase a pegar no sono, um criado me acorda com um objeto curioso nas mãos, que encontrou enquanto escavava um buraco no quintal para transplantar uma palmeira.


É uma placa. Nem de ferro, nem de madeira, nem de baquelite. Nada que se assemelhe a material conhecido. Sobreposto ao fundo branco da coisa, toda rachada e coberta de terra, uns estranhos dizeres em vermelho: “Multipark”.


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