TREM DOIDO





- Ô leseira, não passa um raio de carro nessa estrada hoje. Até agora não vi nenhum. Cê viu, Cacau?

- Nadinha, nem carroça. Não dá nem pra brincar de adivinhar qual a cor dos carro que vem vindo.

- É. Nem isso. Vida besta.

- Tô sentindo uma coisa pontuda espetar meu pé. Deixa eu cavar um pouquinho pra ver o que é.

- Tivesse vindo de conga, que nem eu, não espetava nem nada.

- Parece um negócio de papelão.

- Puxa pra fora, tá enterrado.

- Já vai , tô tentando.

- Nossa, que que é isso? Tá com jeito de ser uma capa de disco velha.

- É nóis nesse retrato aqui, olha só, Tonho! Até a nossa roupa é igual à que a gente tá usando hoje.

- É nóis mesmo. Nossa, agora que deu um nó na cabeça...

- Então, como é que pode isso? Vixi!

- Tem uns escrito aqui desse lado... Clu...be da... Es... es... es...qui...na. Clube da esquina.

- Que raio de troço é esse?

- Sei lá eu. Meu pai uma vez falou que esquina é uma coisa que tem na cidade, não tem aqui na roça não. Agora, clube eu nunca ouvi falar. Cê sabe o que é?

- Não.

- Vem vindo um carro, ó só.

- Uia, ô trem esquisito. A chapa é branca em vez de amarela, tem um monte de número e letra. Não é Opala, nem DKV, nem Fusca e nem Corcel.

- Rapaz, bonitão memo esse carro aí. Diferente desses que a gente vê passar aqui.

- Parece que é coisa de outro mundo. Tô é ficando com medo, isso sim.

- Tá parando, abriu as porta.

- Tonho, tô vendo uma moça no banco de trás olhando assustada pra nóis. Óia pra gente e depois pra um disquinho pequeno e brilhante, com o mesmo retrato que a gente encontrou agora de pouco. Parece que viu sombração. O homi que tá dirigindo também não tira o olho da gente. E que que é esse negócio de vrido preto encostado na oreia dele? Fica falando sozinho com esse negócio no ouvido!

- Eita. Deve ser viajante perdido. Errô o caminho.

- Só pode.





Esta é uma obra de ficção

© Direitos Reservados

Imagem: foto de capa do disco "Clube da Esquina". Cafi (fotógrafo).

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